Medicina
Antroposófica
"Muitas são as esferas da vida e, para cada uma se desenvolve
uma ciência especial. Entretanto, a vida em si mesma
forma uma unidade e, quanto mais as ciências procuram
explorar domínios isolados, mais se afastam da visão
do mundo como um todo vívido. Deve existir um saber
que procura, nas ciências particulares, os elementos
para conduzir o homem à plenitude da vida."
Rudolf Steiner
Na visão de mundo materialista a natureza é
colocada caprichosamente a serviço do Homem num caminho
unilateral. Assim, o ser humano vem se separando da concepção
do princípio primordial que a tudo permeia, que preenche
de força configurativa o mineral, e aquela atividade
que tece e plasma os seres vivos dentro do seu sentido do
Eu. A identificação das partes de um todo pode
auxiliar na compreensão do organismo, sendo, portanto
algo imprescindível, na história da busca de
conhecimento do homem. Porém, realizada esta identificação
é necessário compreender a complexa correlação
entre elas. Neste particular está o grande desafio
para o homem contemporâneo.
Os desastres advindos da concepção materialista,
assistidos no cenário mundial na atualidade, de certa
forma, resgatam a necessidade da vivência da unidade,
da correlação existente entre as partes em prol
do todo.
Em 1986, houve um Congresso Internacional em Veneza, cujo
tema foi “La Science face aux confins de la Connaissance”,
que propôs a Metaciência Transdisciplinar através
dos seguintes itens:
• O ser humano não pode ser reduzido a uma única
imagem.
• A realidade contém diferentes níveis
de ser, e não apenas um nível.
• É mister que os vários saberes se reúnam,
dialoguem, se compreendam.
A visão transdisciplinar é aberta, unificadora,
também compatível com a Arte, com todas as Etnias
e Religiões, e com a poesia e a ética.
Não há uma Etnia privilegiada sobre as demais
que possa ser lócus central de referência: Propõe-se
a transculturalidade igualitária entre os diferentes.
O momento atual é de transição. Vive-se
a crise do paradigma pensamental, em que a humanidade está
próxima de romper os portais que lhe possibilitará
o resgate da consciência, a mudança cultural
de paradigma, rumo ao Pensar Livre, crucial para a nova visão
de mundo. Isto lhe trará reais e melhores condições
de vida em suas diversas instâncias. Desta feita, o
ser humano é novamente considerado uma imagem condensada
do cosmos, um microcosmo, em contínua respiração
com o macrocosmos. Irmanada à proposta de conhecimento
científico, apelo à arte e a prática
social, nesta busca, neste empreendimento está a Antroposofia.
Nesse sentido a Antroposofia permeia várias correntes
profissionais:
• Medicina Antroposófica, áreas e terapias
afins (Massagem Rítmica, Euritmia, Quirofonética,
Terapia Artística, Biografia Humana)
• Odontologia Antroposófica
• Farmacologia Antroposófica (com seus remédios
antroposóficos)
• Pedagogia Waldorf
• Agricultura Biodinâmica
• Pedagogia Curativa
• Pedagogia Social
Todas estas correntes confluem para o exercício
do tema SAÚDE.
E relativo à Medicina, encerrando algo que diz respeito
ao exercício da cura, esta é uma palavra que
dispensaria adjetivos, pois se espera de sua prática
o melhor para o Ser Humano encerrado no Cosmos e que, portanto
tem este cosmos dentro de si.
A palavra medicina é termo que, dado a sua amplitude,
tem sido desmembrada à medida que aparece adjetivada
por outra palavra que caracteriza então sua prática
designada por aquela terminologia.
Assim, temos medicina alopática, medicina convencional,
medicina chinesa e acupuntura, medicina tibetana, medicina
homeopática, medicina ayurvédica, medicina fitoterápica,
medicina natural, medicina antroposófica, etc.
De toda maneira, a medicina, quando bem praticada, encerra
inexoravelmente prósperos resultados.
A medicina antroposófica, como então se espera
da boa medicina, dá prioridade à boa prática
médica.
Entende-se por boa prática médica o empreendimento
dos resultados de pesquisas em cuja intencionalidade está
de fato o bem comum, à medida que se contempla de forma
prática as várias partes do todo, rica e complexamente
integradas, aliada à valorização do real
encontro entre duas pessoas que se colocam na proposta de
cura.
Assim, respeitando e acolhendo todas estas práticas
médicas, a medicina antroposófica aborda o ser
humano de forma a contemplar suas partes integradas ao todo.
***************************************************************
A medicina antroposófica é uma ampliação
da medicina acadêmica; não se opondo a esta última,
não se trata de uma medicina alternativa. Convém
ressalvar que a própria fragmentação
da medicina em várias escolas e medicinas ditas “alternativas”,
reflete a perda da visão integral do homem.
Muitas das correntes do pensamento moderno entendem o ser
humano como um animal especializado e refinado pela evolução
das espécies, fato que, desta forma pode ser explicado
pelos princípios da Física e da Mecânica.
Frente a este raciocínio, não são valorizados
aspectos fundamentais do ser humano, quais sejam o ambiente
no qual está inserido, os aspectos sócio-culturais,
sua história de vida, seus laços afetivos e
familiares, seus pensamentos, seus sentimentos, sua religiosidade,
etc.
Atualmente já se vislumbra a necessidade da compreensão
destes aspectos, entretanto dissecar e dissolver o emaranhado
de pontos confusos criados devido a esta desconsideração,
consiste em trabalho hercúleo e tambmé isto
é fato gerador de dificuldades que travam sua dissolução.
A medicina acadêmica ganhou muito com o cientificismo
materialista. Foi-lhe possível conhecer detalhes intrínsecos
da anatomia, fisiologia, microbiologia, bioquímica
e tantas outras áreas. Isto contribuiu para uma super
especialização do conhecimento do corpo humano.
Equipamentos modernos, substâncias sintéticas
passam a fazer parte do arsenal terapêutico e o ser
humano agora é tratado por elementos bioquímicos,
órgãos e/ou sistemas.
À medida que estes instrumentos ganham terreno, surge
o risco de deixar à deriva o humano que considera a
integração de todo o organismo entre si e a
natureza. O fato é que, embora os benefícios
para o diagnóstico e tratamento tenham aumentado, perdeu-se
a capacidade de compreender o ser humano como um todo.
A medicina antroposófica observa neste contexto o ser
humano além do corpo físico, realçando
sua vida psíquica e sua individualidade em suas instâncias
dinâmicas e interativas consigo próprio e para
com o mundo: o corpo, a alma e o espírito.
Buscando uma atuação mais viva, a medicina antroposófica
resgata o artístico e visa compreender o homem em seu
contexto, em suas diversas dimensões, por entendê-lo
como ser corpóreo, anímico e espiritual.
Assim, a medicina antroposófica utiliza-se dos métodos
das ciências naturais que perscrutam os detalhes da
natureza física/corporal do organismo humano ampliando-os
para a compreensão de que além da organização
física, o homem possui três organizações:
a organização vital, a anímica e a espiritual.
• A organização vital ordena os fenômenos
físicos como fenômenos viventes
• A organização anímica reordena
os fenômenos físicos e vitais de forma a possibilitar
a aparição da consciência
• A organização espiritual, individual
de homem para homem, organiza as instâncias anteriores
conferindo-lhes uma organização biológica
individual.
A medicina acadêmica se baseia nos métodos das
ciências naturais. A medicina antroposófica também
se utiliza dos mesmos métodos para o conhecimento do
homem físico. Para o conhecimento das organizações
vital, anímica e espiritual, entretanto, baseia-se
no método da ciência espiritual ou antroposofia.
Os fundamentos da medicina antroposófica surgiram na
Europa, no início do século XX, a partir do
trabalho conjunto de um grupo de médicos orientados
pela médica Ita Wegman, por sua vez orientada por Rudolf
Steiner.
De acordo com a metodologia da Ciência Espiritual, em
sua pesquisa ampliada, temos quatro estruturas essenciais
– também chamadas de corpos essenciais –
e que constituem a entidade humana. Pode-se fazer uma analogia
com os quatro reinos da natureza, os quatro elementos alquímicos
fundamentais, os quatro temperamentos.
• O corpo físico: sólido, mineral, substancial,
existente em diversas formas, em todos os reinos da natureza
(mineral,terra).
• O corpo vital ou etérico: fundamento da vida,
das características puramente vegetativas, crescimento,
regeneração e reprodução, presentes
em todos os organismos vivos (vegetal, água)
• O corpo anímico: é o fundamento da organização
sensitiva do homem; reordena os processos biológicos,
permitindo a aparição do sistema nervoso e da
vida psíquica no mundo animal e no homem (animal, anima,
alma, ar)
• A organização para o Eu: é a
organização própria do homem, considerada
como nossa entidade espiritual e responsável pela autoconsciência,
reorganizando as atuações dos outros três
corpos. Sua presença determina o surgimento do andar
ereto e das capacidades do falar e pensar – observe-se
que somente o homem é capaz destas propriedades e são
únicas para cada um! – esta organização
está relacionada com o calor no âmbito do organismo
(espírito, calor, fogo).
Estas quatro organizações, por sua vez agrupam-se
reciprocamente em três formas diferentes no organismo
humano, surgindo assim uma estrutura funcional e anatômica
de constituição tríplice:
• O sistema neurosensorial: concentrado principalmente
na região da cabeça, mas também distribuído
por todo o corpo. Ele está a serviço da consciência.
São áreas de relativo repouso biológico.
• Sistema rítmico: cujo centro funcional se encontra
na região torácica, onde a característica
das funções pulmonar e do coração
é o ritmo. Também presente nos ritmos de outras
funções biológicas, fora da cavidade
torácica. É uma área onde o repouso e
o movimento se equilibram.
• Sistema metabólico e das extremidades: agrupa
todos os processos metabólicos, base para o sustento,
regeneração e movimento do organismo, cujos
órgãos principais se concentram na cavidade
abdominal e extremidades; mas funcionalmente presente, tal
como os outros dois sistemas em todo o organismo e em cada
uma de suas células e tecidos. São áreas
de intensa movimentação biológica.
A reciprocidade entre estes três sistemas muda durante
a vida do ser humano, de idade para idade, vinculando-se com
essa mudança biológica as mudanças que
ocorrem psicológica e espiritualmente no desenvolvimento
das pessoas.
Transtornos nesta transformação através
do tempo levam a um desequilíbrio na relação
recíproca desses três sistemas e esta é
a causa primária das doenças.
O diagnóstico em medicina antroposófica envolve,
além da anamnese (história do paciente), do
exame clínico e dos exames complementares, a pesquisa
dessas estruturas não sensíveis da natureza
humana (corpo vital, anímico e organização
para o Eu), por meio da metodologia própria desenvolvida
a partir do fenomenológico do modelo vivo saudável,
proposto pela antroposofia.
A terapêutica antroposófica utiliza-se de medicamentos
específicos, oriundos de substâncias dos reinos
mineral, vegetal e animal, preparados através de processos
farmacêuticos próprios de diluição
e dinamização e de terapias complementares como
terapia artística, massagem rítmica, aplicações
externas, euritimia curativa, musicoterapia, quirofonética,
além de orientação biográfica,
alimentar e prática de exercícios físicos.
A medicina antroposófica pode ser utilizada em conjunto
aos medicamentos alopáticos e/ou procedimentos cirúrgicos
conforme indicação. Convém ressaltar
que, seja em doenças agudas ou crônicas, a aplicação
da terapia antroposófica reduz ou substitui gradativamente
o uso de medicamentos químicos.
O tratamento é, por conseguinte, individualizado visando
o equilíbrio do homem com um todo, sendo útil
igualmente no alívio dos diversos sintomas.
Objetiva-se estimular o indivíduo no sentido de que
ele, sempre que possível, ative seu processo de cura.
Entende-se que a doença e sua superação
têm um sentido e fazem parte do processo de desenvolvimento
de cada um.
A formação em medicina antroposófica
requer formação acadêmica em escola reconhecida,
acontece em São Paulo, anualmente na Clínica
Tobia e em diversos estados do Brasil. Tem duração
de três anos – curso lato sensu e é oferecido
pela Associação Brasileira de Medicina Antroposófica
(ABMA).
Atualmente a medicina antroposófica é praticada
em 44 países nos cinco continentes. Muitas são
as instituições médicas, clínicas
e hospitais que utilizam seus conhecimentos para cuidar, curar
e aliviar o sofrimento humano, juntamente com os melhores
recursos da medicina, algumas vezes subvencionados por seguros
de saúde privados ou até pelo poder público,
como ocorre em alguns países da Europa.
Existem iniciativas médicas antroposóficas já
consagradas em diversos estados brasileiros, o Terapeuticum
Rafael e a Clínica Médica Vivenda Santan’na
em Juiz de Fora (Minas Gerais), a GAIA (Grupo de apoio às
iniciativas antroposóficas) do Rio de Janeiro, Clínica
Vialis (Florianópolis, Santa Catarina), a Artemísia
(centro de desenvolvimento humano e reestruturação
biográfica) (São Paulo), a Lucas Terapeuticum
Desenvolvimento Humano (Sorocaba), a Casa do Sol (voltada
para crianças especiais), o trabalho médico-social
na Favela Monte Azul em São Paulo, na cidade de São
João Del Rei (Minas Gerais), junto ao programa de saúde
da família e sua presença oficial na rede pública
de saúde em Belo Horizonte.
Em fevereiro/2008 foi colocada a pedra fundamental do primeiro
hospital antroposófico das Américas na cidade
de Matias Barbosa – Minas Gerais, além da criação
da Associação Antroposófica Estrada Real
que coordena o então andamento da construção
do hospital.
Desde 1991 vem sendo realizado trabalho voluntário
médico, pedagógico e social no bairro do Jaçanã,
coordenado por profissional médico com formação
em medicina antroposófica, para a comunidade da zona
norte de São Paulo. A partir de 1997 o trabalho passou
a ser conduzido a partir dos princípios da Ánthropos
– Sophia e Medicina Antroposófica – Instituto
Médico, Pedagógico e Social Sol-Violeta.
Além destas instituições existem vários consultórios ou clínicas médicas, ambulatórios médicos que desenvolvem um amplo trabalho em Aracaju, Campina Grande, Brasília, Porto Alegre, Belo Horizonte, Juiz de Fora, São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis e outras cidades.
Segundo Parecer 21/93, de 10.12.93 , Portaria MS 1600, de 17.7.06, Resolução RDC 26, de 30.3.07, Parecer 465, de 24.7.07, reconhecem a Medicina Antroposófica e o médico antroposófico, como "prática médica” e aprova a constituição do “Observatório” das Experiências de Medicina Antroposófica no SUS – PNPIC.
Reconhecem também Farmácia Antroposófica e o farmacêutico antroposófico e dispõe sobre o registro de medicamentos dinamizados industrializados homeopáticos, antroposóficos e anti-homotóxicos.
A literatura consultada para a elaboração deste
texto é de autoria de Rudolf Steiner e os textos apresentados
sobre Antroposofia e medicina antroposófica são
resultados do compilar de diversos trabalhos dos professores
e médicos Antonio José Marques, Bernardo Litvak
Kaliks, Darlan Schottz Ferreira, Ricardo Ghelman, Samir Wady
Rahme e Wesley Aragão de Moraes, do Sr. Rudolf Lanz
(in memorian) e da médica que assina o presente texto.
| Top