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A Televisão e o desenvolvimento infanto – juvenil:
“o outro lado da TV”.
Num estudo feito por Condry (1984) em crianças americanas de 4 a 14 anos, concluiu-se que o conjunto de todas as suas fontes de informação é constituído igualmente por: pais, colegas de mesma idade, a escola e a TV.
Ao se compor a formação do ser humano atual, não podemos deixar de considerar a influência dos meios de comunicação como parte integrante e, em muitos casos, decisiva desta.
A televisão, por sua acessibilidade e abrangência, é o veículo que dita mais diretamente as tendências em todos os âmbitos, especialmente por lidar com imagens.
Sabe-se que para que haja um desenvolvimento sadio da criança e do jovem, deve-se considerar igualmente a formação do seu intelecto, sua vida de sentimentos e sua vontade (pensar, sentir, querer).
Nesse caminho, a capacitação dos sentidos tem papel fundamental para se alcançar esse objetivo. As vivências sensoriais são potencialmente plasmadoras, participando da formação física e anímica da criança.
É através dos sentidos que o ser humano tateia, descobre e introjeta o mundo à sua volta; somente mais tarde e paulatinamente, ele vai desenvolvendo o pensar, o raciocínio. A imagem que ele terá do mundo, bem como seu relacionamento com este, será diretamente proporcional à sua capacidade de observação. Portanto, quanto mais rica for a vivência dos sentidos (texturas, paladares, formas, cores, sons etc.), melhor preparado estará o jovem em sua vida futura.
Será que a Televisão pode influenciar esse desenvolvimento?
Vejamos: de todos os sentidos, a visão é a candidata a sofrer maior influência. Os olhos possuem um mecanismo de acomodação que regula seus movimentos (perto e longe).
Na frente da televisão, essa acomodação não é necessária, já que a TV está sempre na mesma distância, o que resulta numa preguiça óptica, tendendo a degenerar o olho pouco a pouco.
Os movimentos da cabeça, que conduzem o olhar (direita, esquerda, acima, abaixo, atrás), tampouco são necessários – e assim, ao assistir TV, todo corpo realiza o mínimo de exercícios, impedindo uma formação muscular sadia, com reflexos importantes na composição da postura.
Além disso, o olhar fica fixo, não se tem noção de perspectiva, tudo é bidimensional, não correspondendo ao mundo real. O espectador é obrigado a ver tudo; não pode escolher um aspecto e desprezar outros, o que o auxiliaria no cultivo de sua individualidade e sensibilidade. A velocidade na apresentação das imagens é quase uma violência se comparada à situação de uma caminhada na natureza, onde se tem a oportunidade de determinar a intensidade e velocidade daquilo que se quer ver. O ouvido recebe sempre um som manipulado, artificial e de um mesmo ponto.
Os outros sentidos também não são estimulados, pois, os objetos são irreais, não têm cheiro, peso, textura, etc., em nada contribuindo com o desenvolvimento sadio dessas características tão importantes na infância e também nas épocas vindouras, pois os sentidos formam a base daquilo que será futuramente o próprio SENTIR.
É fácil imaginar como se compõe a fantasia e o entrosamento de uma criança, que se submete por horas a fio, a um aparelho de TV, sem oportunidade de trocas, de argumentação e até mesmo de conflitos! Alem disso é bom lembrar que o mundo da criança, por certo, não deveria ser uma poltrona na escuridão recebendo imagens irreais numa telinha. Só por isso já poderemos esperar uma atrofia da criatividade (e da musculatura) uma passividade, uma alienação, e uma inibição da vontade, já que elas são todas sugeridas pela própria TV.
Se considerarmos que a criança até os sete anos é um imitador, e que o jovem também procura identificação nas pessoas e fatos do meio ambiente – valores éticos, intelectuais, espirituais, sociais, quais personagens ou acontecimentos seriam dignos de oferecer esses valores nos programas de televisão? Como poderá uma criança aprender a respeitar o que o outro diz, calar-se para ouví-lo, se todos falam enquanto a TV também fala?
Como perceber a maravilhosa sutileza de um concerto, se ao mesmo tempo pode se comer um sanduíche ou um prato de macarrão?
Sons e imagens artificiais podem desenvolver um paulatino embrutecimento sonoro e visual, impondo um crescente desinteresse por espetáculos delicados, que exijam algum esforço desses sentidos, ou até mesmo pela voz de um professor ou um instrumento musical; não se percebe mais as nuances de sons.
Segundo Setzer.W., existe um enorme campo de distúrbios que poderiam advir dessa prática em sentido exagerado.
O mais comum sem dúvida é a falta de concentração. A avalanche de imagens e sons das muitas horas diante da TV impede a criança de, posteriormente, assistir tranquilamente a uma aula.
Segue-se a incapacidade de memorizar, dislexias, distúrbios psicomotores, entre outros. Isso sem contar a dificuldade para desenvolver a própria personalidade, uma vez que a televisão já escolheu, já pensou, já disse, sendo tudo incutido inconscientemente, mas com grande força, massificando e impedindo o individualismo sadio. Não é de se espantar que na Europa já existam hospitais especializados em males ocasionados pela televisão! (Setzer W., 2005)
Mas certamente teríamos que indagar: deixar a criança sem assistir TV não poderia aliená-la ou frustrá-la? Devemos ter atenção com o que é veiculado, tanto no sentido do conteúdo quanto da forma e do tempo, especialmente no caso de crianças e jovens, que, potencialmente são os mais sujeitos a uma poluição dos sentidos, podendo afetar profundamente a formação da própria personalidade.
Talvez devêssemos debater mais sobre o papel educador dos pais, no sentido de tornarem-se mais ativos, tanto para não cometer exageros, como para substituir a televisão por outras atividades produtivas, estimulantes, socializadoras, promovendo uma formação equilibrada, engajada e, portanto, integralmente sadia.
Dra. Elaine Marasca Garcia da Costa é médica Pneumologista com formação em Antroposofia/Biografia Humana. Mestre em Ciências da Educação. Docente/coordenadora do curso de pós-graduação - Antroposofia na Saúde. Presidente da Liga dos Usuários da Medicina e Terapias Antroposóficas. Diretora Clínica do Lucas Terapeuticum D. H.
emarasca@splicenet.com.br
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